quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Canto IV - Neide Archanjo



Mar aberto


Roteiros singrados.
E no poema
o mapa
feixe de terra e água abraçadas.

            Ando com a alma cheia de ventos
            a navegar em alta solidão.

Estou tomando
o caminho de volta
entre angustiado e surpreendido encanto
entre as aves do céu
e a música deste mar profundo.
Nenhum deus a me fazer companhia
ou qualquer humano.
Estou só como Heitor
diante da morte
a lhe rondar o escudo reluzente.
Suspensa em meu pavor
de carne e ossos.
E espanto.

            E
            de quando em quando
            um medo prévio
            travando o passo.

Um só oceano
desde os deuses
E mares vários.

            Na placenta do mar
            hibernam os povos
            Chegada a hora
            circunavegam
            secretos e brilhantes.

Há qualquer coisa de árvore
no oceano.
Raízes e ramos.

            Caminho aquoso
            onde marcha o tempo
            e o céu singra
            cúmplice
            o mesmo segredo.

Verde
saída do mar
a manhã pende
nesta marinha.

            Provável momento
            este de amar ao sol
            rodeada de mar.

Ondas azulam
o grande corpo
que respira.
Entre elas
ainda
Ulisses marinha.

Quem tece meu retorno
por este mar
de lodo e seda?
Quem me escora
o medo?

            Mar cor de vinho
            como e quando voltar?

            Enquanto os remos avançam
            o mercúrio se organiza
            e é o poema.

Com a tarde nos braços
te navego
alta água antiquíssima.

            Nunca soubemos bem
            cretenses
            fenícios
            egípcios
            assírios
            persas
            gregos
            vikings
            portugueses e seus filhos
            que coisa é o mar.


(do livro "As marinhas", Ibis Libris)
 


Nenhum comentário:

Postar um comentário